A pejotização é quando uma empresa contrata um profissional como pessoa jurídica (PJ), mas exige dele comportamentos típicos de um empregado CLT, como jornada fixa, subordinação e exclusividade.
Essa prática tem se tornado cada vez mais comum no mercado de trabalho brasileiro como tentativa de evitar encargos trabalhistas e tributários. No entanto, quando feita indevidamente, pode configurar fraude trabalhista e gerar passivos milionários para a empresa.
Segundo dados da Fundação Getúlio Vargas, divulgados pela Valor Econômico, entre 2015 e 2023, a proporção de trabalhadores contratados como pessoas jurídicas cresceu de 8,5% para 14,1%, alcançando aproximadamente 20 milhões de pessoas nesse tipo de regime.
Para profissionais de RH, é fundamental entender os limites entre a terceirização lícita e a pejotização fraudulenta. A gestão de pessoas precisa caminhar lado a lado com a conformidade legal.
Este artigo explica o que caracteriza a pejotização, como ela é interpretada pelo Judiciário, os riscos para o empregador e como evitá-la na prática, adotando modelos contratuais seguros e juridicamente válidos.
O artigo será construído por meio dos tópicos abaixo:
- O que é pejotização? E como funciona?
- A pejotização é legal?
- Qual a diferença entre modelo CLT e modelo PJ?
- Quais os riscos da pejotização para as empresas?
- Como evitar a pejotização indevida na empresa?
Continue lendo para entender como contratar com segurança e se manter em compliance com as leis trabalhistas brasileiras.
O que é pejotização? E como funciona?

A pejotização ocorre quando uma empresa contrata um trabalhador como pessoa jurídica (PJ), mas exige dele obrigações típicas de um empregado CLT, configurando fraude à legislação trabalhista.
Em vez de assinar a carteira do trabalhador e arcar com os encargos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o empregador exige que o profissional abra um CNPJ e emita notas fiscais como se fosse um prestador autônomo.
No entanto, na prática, ele cumpre jornada fixa, responde a ordens diretas, não pode recusar tarefas e trabalha com exclusividade.
Origem da pejotização no Brasil
A pejotização surgiu como uma alternativa informal para reduzir os altos custos das contratações CLT, especialmente após a Constituição de 1988, que garantiu uma ampla proteção ao trabalhador, com encargos como FGTS, INSS, férias, 13º salário, aviso-prévio, entre outros.
Com o tempo, essa prática passou a ser usada irregularmente, substituindo vínculos empregatícios por contratos PJ para mascarar obrigações trabalhistas. E o que começou como uma tentativa de flexibilização contratual acabou se tornando, em muitos casos, uma fraude trabalhista disfarçada de prestação de serviços.
Diante do aumento dessas ocorrências, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) passaram a identificar casos em que profissionais atuavam de forma subordinada, sob fachada de PJ, caracterizando fraude à legislação trabalhista.
Qual a diferença entre contratar um PJ e cometer pejotização?
A contratação de uma pessoa jurídica é lícita quando o prestador PJ pode definir seus próprios horários, atender múltiplos clientes, recusar demandas e organizar sua atividade sem subordinação hierárquica.
Nesses casos, não há vínculo empregatício e a relação é regida por contrato civil ou empresarial. Já a pejotização se caracteriza pela presença dos elementos típicos da relação de emprego, previstos no artigo 3º da CLT: subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade.
Confira abaixo as principais diferenças entre a contratação PJ legal e a pejotização indevida:
Característica | Contratação PJ Legal | Pejotização (PJ disfarçado de CLT) |
Subordinação | Não há | Sim, recebe ordens diretas da empresa |
Liberdade de horários | Sim, define sua rotina | Não, cumpre jornada fixa |
Possibilidade de múltiplos clientes | Sim, pode atender outros contratantes | Não, exclusividade com a empresa |
Local de trabalho | Escolhido pelo prestador | Obrigado a trabalhar na sede ou remoto sob controle |
Emissão de nota fiscal | Sim | Sim, mas com vínculo disfarçado |
Risco jurídico para a empresa | Baixo | Alto – pode gerar reconhecimento de vínculo e passivos |
Tipo de contrato | Civil ou empresarial | Simulado – com indícios de vínculo CLT |
A pejotização é legal?
A pejotização só será aceita juridicamente se a contratação como pessoa jurídica for real, voluntária e baseada em autonomia profissional. O simples fato de uma empresa contratar prestadores via CNPJ não constitui, por si só, uma fraude.
O problema surge quando esse modelo é usado para simular uma prestação de serviço, enquanto, na prática, o trabalhador atua sob condições idênticas às de um empregado formal.
A Justiça do Trabalho não se prende apenas ao contrato formal, mas analisa a realidade da relação de trabalho. Se ficar caracterizado que o profissional, mesmo sem carteira assinada, é subordinado, cumpre jornada fixa, depende economicamente da contratante e não tem liberdade de atuação, o contrato pode ser anulado e o vínculo CLT reconhecido judicialmente.
O que diz a legislação trabalhista?
A CLT, em seu artigo 9º, estabelece que atos praticados com o objetivo de fraudar a aplicação da legislação trabalhista são nulos de pleno direito.
Isso significa que qualquer contrato que simule uma relação comercial, mas que tenha os elementos característicos do vínculo empregatício, poderá ser desconsiderado pelo Judiciário.
Além disso, o artigo 3º da CLT define como empregado toda pessoa física que presta serviços de forma pessoal, habitual, subordinada e onerosa.
O que importa para o Judiciário é a realidade dos fatos, não o contrato assinado.
E o Tema 1389 do STF?
O Supremo Tribunal Federal está analisando o Tema 1389 da Repercussão Geral, que trata da licitude da terceirização e da contratação de PJ sem vínculo empregatício.
Embora o julgamento ainda não tenha sido concluído, a tendência é que o STF reforce a ideia de que a pejotização só será válida quando não houver subordinação direta nem exclusividade na prestação de serviços.
Até o momento, predomina o entendimento de que o modelo PJ é legal quando usado de forma autônoma, mas se torna fraudulento quando oculta obrigações trabalhistas. Todos os processos em andamento estão suspensos enquanto a decisão não é tomada.
Em entrevista para a CNN, o advogado trabalhista Miguel Marin Ruiz disse que “A decisão do ministro Gilmar Mendes é significativa porque suspende todos os processos[…]. Isso permitirá definir se a Justiça do Trabalho é competente para julgar a legalidade dos contratos[…]”.
Qual a diferença entre modelo CLT e modelo PJ?

A diferença entre os regimes CLT e PJ está na natureza da relação: a CLT garante vínculo empregatício e direitos trabalhistas, enquanto o modelo PJ estabelece uma relação contratual entre empresas, sem subordinação direta.
O regime CLT é regido pela Consolidação das Leis do Trabalho e estabelece um contrato formal entre empregador e empregado. O trabalhador CLT tem direitos previstos em lei, e o custo para a empresa é maior, considerando encargos sociais e obrigações acessórias.
Já o modelo PJ se dá entre duas pessoas jurídicas, a empresa contratante e o profissional prestador de serviços, que formaliza um CNPJ. Nessa relação, não há obrigações trabalhistas por parte da empresa.
A seguir, confira uma comparação objetiva entre os dois regimes:
Aspecto | Modelo CLT | Modelo PJ |
Natureza da relação | Relação de emprego (regida pela CLT) | Relação comercial (contrato entre empresas) |
Subordinação | Sim, com ordens diretas do empregador | Não, o prestador atua com autonomia |
Direitos trabalhistas | Sim: férias, 13º, FGTS, etc. | Não possui direitos trabalhistas |
Estabilidade | Proteção contra demissão arbitrária | Pode ser rescindido a qualquer momento |
Encargos para empresa | Alto custo com tributos e obrigações acessórias | Custos limitados ao pagamento contratado |
Contribuição previdenciária | Descontada e recolhida pelo empregador | Responsabilidade do prestador PJ |
Exclusividade | Pode haver cláusulas de exclusividade | Não pode haver exclusividade sob pena de vínculo |
Riscos jurídicos | Baixos, desde que a CLT seja respeitada | Altos se configurar pejotização indevida |
Quais os riscos da pejotização para as empresas?
A pejotização indevida expõe as empresas a passivos trabalhistas vultosos, autuações fiscais e danos à reputação corporativa. O risco é alto, especialmente quando há vínculo empregatício disfarçado.
Isso torna a organização vulnerável à fiscalização de órgãos como o Ministério do Trabalho, atuação do Ministério Público do Trabalho (MPT) e ações movidas por ex-colaboradores na Justiça do Trabalho.
A principal consequência é o reconhecimento judicial do vínculo empregatício. Isso obriga o empregador a pagar todos os direitos retroativos devidos ao trabalhador como se ele tivesse sido CLT desde o início da relação, além de eventuais indenizações por danos morais, honorários advocatícios e multas.
Os valores podem ultrapassar seis dígitos em ações individuais, e, se houver indícios de sistematização da prática, o risco se estende para ações civis públicas e TACs (Termos de Ajustamento de Conduta).
Passivos trabalhistas e ações judiciais
O passivo trabalhista é o acúmulo de obrigações não cumpridas que podem gerar condenações futuras. No caso da pejotização, isso inclui verbas rescisórias, férias, 13º salário, FGTS, INSS, adicional de horas extras, entre outros.
Quando o vínculo é reconhecido judicialmente, esses valores precisam ser quitados com correção monetária, juros e eventuais penalidades.
Em dados divulgados pela CNN, só em 2024, foram registrados pela Justiça do Trabalho 285.055 processos que solicitavam o reconhecimento de vínculo empregatício em casos envolvendo PJ. Esse número representa um aumento de 57% em relação a 2023.
Fiscalização do Ministério do Trabalho e MPT
Denúncias podem ser feitas por trabalhadores, sindicatos ou até por auditorias internas. Os auditores fiscais podem lavrar autos de infração, aplicar multas e exigir a regularização imediata dos contratos.
Já o MPT pode ingressar com ações civis públicas, pedir indenizações por dano moral coletivo e exigir a assinatura de TACs com obrigações futuras.
A reincidência ou resistência ao ajuste pode resultar em multas diárias, bloqueios judiciais e responsabilização direta dos gestores.
Como evitar a pejotização indevida na empresa?
A prevenção da pejotização começa pela estruturação correta da relação contratual. Não basta que o profissional possua um CNPJ e emita nota fiscal. RH e jurídico devem atuar de forma integrada para avaliar cada função, o grau de subordinação, a regularidade do serviço e os riscos associados.
O modelo PJ só é juridicamente seguro quando houver ausência clara de subordinação e pessoalidade.
Faça uma avaliação jurídica dos contratos
Antes de optar pela contratação de um PJ, a empresa deve submeter o modelo ao crivo jurídico. É essencial que o contrato reflita com precisão a realidade da relação, sem cláusulas que possam ser interpretadas como típicas de um contrato CLT.
Evite termos como “jornada”, “supervisor”, “avaliação de desempenho”, “exclusividade” ou “subordinação técnica”.
Auditorias internas periódicas ajudam a identificar incoerências entre o contrato formal e a prática operacional. O ideal é revisar não apenas o contrato, mas a conduta cotidiana das lideranças em relação aos prestadores PJ.
Pequenos comportamentos, como impor horários, aprovar folgas ou centralizar ordens, já podem servir como prova de vínculo empregatício em uma reclamação trabalhista.
Alternativas à pejotização (MEI, freelancer, autônomo)
Existem formas legais e mais adequadas para atender demandas pontuais ou funções com menor risco de subordinação. O freelancer, por exemplo, pode ser contratado por projeto, sem vínculo permanente, especialmente para atividades criativas ou sazonais.
O trabalhador autônomo também é permitido por lei, desde que haja inscrição no INSS e contrato claro de prestação de serviços.
O MEI (Microempreendedor Individual) é uma alternativa válida para atividades de baixo risco, com limitações de faturamento e sem exclusividade. No entanto, o uso do MEI como “empregado fixo informal” também pode configurar fraude, caso os requisitos da CLT estejam presentes.
Por isso, mesmo nessas alternativas, a autonomia e a pluralidade de clientes devem estar garantidas.
Para cargos estratégicos, de longo prazo ou com necessidade de controle direto, o mais seguro continua sendo a contratação CLT, que, embora mais onerosa, oferece previsibilidade jurídica e reduz consideravelmente o risco de litígios.
Conclusão
A pejotização, embora amplamente utilizada como estratégia de contenção de custos, representa um dos maiores riscos jurídicos para empresas que contratam sem respaldo legal.
O modelo PJ, quando aplicado de forma indevida, pode configurar fraude trabalhista e gerar passivos milionários, sanções administrativas e danos à reputação corporativa.
Para o setor de RH, a chave está na gestão responsável de contratos e na avaliação criteriosa do modelo de contratação conforme a realidade da função exercida.
Profissionais que atuam com subordinação, exclusividade e dependência não devem ser contratados como pessoas jurídicas, sob pena de responsabilização judicial.
Evitar a pejotização não significa evitar a flexibilidade. Significa contratar com inteligência jurídica e segurança operacional.
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O Time Pontotel é composto por especialistas em administração, recursos humanos, direito e tecnologia, com experiência em controle de ponto digital e legislação trabalhista. Nossos recursos vêm de fontes oficiais, como o site do Governo Federal e a CLT. Além disso, passam por uma revisão conjunta do departamento jurídico e de Recursos Humanos. Esse processo assegura dados precisos e atualizados, convertendo alterações legislativas em diretrizes claras para empresas que desejam eficiência e conformidade.